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EFEITOS DA EXPOSIÇÃO À FUMAÇA DO CIGARRO NO PROCESSO DE REMODELAÇÃO CARDÍACA EM RATOS
(especial para SIIC © Derechos reservados)
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unesp.jpg Autor:
Sergio Alberto Rupp de Paiva
Columnista Experto de SIIC

Institución:
Universidade Estadual Paulista, Faculdade de Medicina, Departamento de Clínica Médica

Artículos publicados por Sergio Alberto Rupp de Paiva 
Coautores
Daniella de Rezende Duarte*  Leonardo António Mamede Zornoff** 
Dra.*
Professor Dr.**

Recepción del artículo: 21 de febrero, 2006

Aprobación: 10 de marzo, 2006

Primera edición: 7 de junio, 2021

Segunda edición, ampliada y corregida 7 de junio, 2021

Conclusión breve
Pouco se conhece sobre as conseqüências diretas do fumo no coração. Estão resumidos os dados de trabalhos relacionados à ação da fumaça de cigarro em corações de ratos "normais" e de ratos submetidos à agressão, infarto do miocárdio experimental. São discutidos alguns mecanismos.

Resumen

Embora a relação entre o fumo e a doença coronariana seja clara, pouco se conhece sobre as conseqüências diretas do fumo no coração. Inicialmente, avaliamos os efeitos da exposição à fumaça do cigarro por 1 e 4 meses em corações de ratos normais e observamos redução na função ventricular sistólica esquerda. A próxima etapa foi avaliar a influência do tempo da exposição à fumaça do cigarro no processo de remodelação ventricular. Não houve diferença entre os animais expostos à fumaça por 2 e 4 meses, indicando que as alterações cardíacas independem do tempo de exposição. A suplementação de substância antioxidante (beta-caroteno) associada a exposição à fumaça do cigarro atenuou o processo de remodelação ventricular. O efeito da exposição à fumaça do cigarro foi avaliado então em corações submetidos a infarto agudo do miocárdio. A exposição à fumaça intensificou as alterações morfológicas e funcionais cardíacas, entretanto, nos grupo exposto à fumaça, a sobrevida foi significativamente maior. A combinação de beta-caroteno com exposição à fumaça do cigarro aboliu esse efeito protetor do fumo no miocárdio.

Palabras clave
função cardíaca, remodelação ventricular, fumaça do cigarro, infarto agudo do miocárdio, beta-caroteno

Clasificación en siicsalud
Artículos originales> Expertos del Mundo>
página www.siicsalud.com/des/expertos.php/80010

Especialidades
Principal: Neumonología
Relacionadas: Anatomía PatológicaBioquímicaToxicología

Enviar correspondencia a:
Sergio A. Rupp de Paiva, Departamento de Clínica Médica, Faculdade de Medicina, Universidade Estadual Paulista, 18618-000, Botucatu, Brasil

EFFECTS OF CIGARETTE SMOKE EXPOSURE IN THE PROCESS OF CARDIAC REMODELING IN RATS

Abstract
Although the relationship between cigarette smoking and heart disease is clear, little is known about the direct consequences of smoking on the heart. At first, the effects of cigarette smoke exposure for 1 and 4 months on the hearts of normal rats were evaluated, and reduction in left ventricular systolic function was observed. The next step was to evaluate the influence of cigarette smoke exposure time on the ventricular remodeling process. There was no difference in the animals exposed to smoke for 2 and 4 months, which indicates that heart alterations are not dependent on exposure time. The supplementation of antioxidant substance (beta-carotene) associated with cigarette smoke exposure attenuated ventricular remodeling. The effect of cigarette smoke exposure was then evaluated in hearts submitted to acute myocardial infarction. Smoke exposure intensified morphological and functional heart alterations; however, survival was significantly greater in the smoke-exposed group. The combination of beta-carotene with cigarette smoke exposure abolished such protective effect of smoking on the myocardium.


Key words
heart function, ventricular remodeling, cigarette smoke, acute myocardial infarction, beta-carotene

EFEITOS DA EXPOSIÇÃO À FUMAÇA DO CIGARRO NO PROCESSO DE REMODELAÇÃO CARDÍACA EM RATOS

(especial para SIIC © Derechos reservados)

Artículo completo
Introdução

O hábito de fumar gera cerca de 6 700 substâncias, das quais 4 720 foram identificadas.1-2 Essas substâncias possuem duas procedências: a folha do fumo e a combustão do fumo, originando a fumaça. A fumaça pode ser dividida em duas fases. A primeira compreende a fase de vapor, na qual temos o monóxido de carbono, dióxido de carbono, óxidos de nitrogênio, ácido acético, dentre outras. A segunda fase é a de partículas, que compreende partículas metálicas, nicotina, anabatina, fenol, catecol, hidroquina, colesterol, g-butirolacetona, quinolina, harmana, ácido benzóico, ácido lático, ácido glicólico e ácido sucínico, entre outras.3

A associação do fumo com a aterosclerose tem sido bastante explorada. Estimativas do risco relativo (RR) para o fumo e a doença cardiovascular variam entre os diversos estudos de 1.5 a 3.0.4-5 English e col foram os primeiros a mostrarem esta relação6 e, desde então, diversos autores têm reforçado a teoria aterosclerótica da fumaça do cigarro. O estudo de Auerbach e col avaliou 1 056 autópsias de indivíduos entre 45 e 75 anos falecidos de causas não cardíacas. Os autores observaram que a aterosclerose das artérias coronárias era quatro vezes mais presente nos indivíduos que haviam fumado dois ou mais maços de cigarros diariamente, em comparação aos que nunca haviam fumado.7 Howard e col mostraram que indivíduos expostos à fumaça de cigarro, de forma ativa ou passiva, apresentavam aumento da espessura da íntima-média da artéria carótida.8 Em estudo prospectivo que envolveu 34 439 médicos ingleses acompanhados por 40 anos, foi observada maior mortalidade por infarto agudo do miocárdio, aneurisma da aorta e vasculopatias em geral em indivíduos fumantes do que em indivíduos controles.9

Os mecanismos responsáveis pela ação aterosclerótica da fumaça do cigarro e sua influência na prevalência do infarto agudo do miocárdio não estão completamente elucidados. Entretanto, sabe-se que o fumo acarreta diminuição das lipoproteínas de alta densidade (HDL), que é prejudicial porque são ricas em apoliproteínas AI e AII, protetoras da parede do vaso contra a aterosclerose. Outra ação do fumo é o aumento das lipoproteínas de baixa densidade (LDL-colesterol) e de sua oxidação. Esse fato é considerado importante fator de risco para o desenvolvimento da aterosclerose,10-12 já que participa ativamente na formação da placa aterosclerótica. Em conseqüência, há aumento das moléculas de adesão e fibrinogênio, aumento na agregação plaquetária, na prevalência de espasmo vascular e na viscosidade sanguínea.

Pelo exposto, a relação entre o hábito de fumar e a doença aterosclerótica é clara. Por outro lado, embora a associação entre o fumo e a doença coronariana seja universalmente aceita, pouco se conhece sobre as conseqüências morfológicas e funcionais diretas do fumo no coração. Apesar de alguns estudos avaliarem a influência de componentes isolados do cigarro no coração, não é possível extrapolar os efeitos da exposição aguda de componentes específicos, como, por exemplo, a nicotina, com os efeitos da exposição crônica da fumaça do cigarro no coração. Desse modo, o objetivo de nossos estudos foi avaliar as conseqüências da exposição à fumaça do cigarro nas variáveis cardíacas morfológicas e funcionais.


Efeitos do fumo no coração normal

Os efeitos da exposição à fumaça do cigarro sobre as variáveis cardíacas em corações normais foram avaliados em três estudos.13-15 Primeiramente,13 ratos Wistar foram alocados em dois grupos, grupo controle (C) e grupo exposto à fumaça do cigarro (F). O método utilizado para a exposição à fumaça foi proposto por Simani e col16 e implementado por Wang e col.17 Os ratos foram colocados em uma câmara transparente com dimensões de aproximadamente 95 x 80 x 65 cm, que permite que vários animais sejam expostos à fumaça ao mesmo tempo. Esta é conectada ao aparelho de fumar que retira fumaça por vácuo e joga na câmara. Após trinta minutos, a fumaça é exaurida e o procedimento repetido. Durante a primeira semana, a fumaça foi liberada a uma taxa de cinco cigarros, duas vezes por dia. O número de cigarros foi aumentado progressivamente para uma taxa de 10 cigarros/30 minutos quatro vezes por dia, até o final do estudo, perfazendo trinta dias de exposição. O cigarro utilizado era cigarro comercial composto por 1.1 mg de nicotina, 14 mg de alcatrão e 15 mg de monóxido de carbono.

Ao final de um mês, os animais foram submetidos ao estudo ecocardiográfico e, após sofrerem eutanásia, foi realizado estudo do músculo papilar para avaliação da função mecânica do coração e estudo das variáveis corpóreas, entre elas os pesos das câmaras cardíacas.

Nesse primeiro13 estudo foi observada redução da função sistólica nos animais submetidos à exposição à fumaça do cigarro por meio de variáveis ecocardiográficas: diminuição da fração de ejeção (F = 0.89 ± 0.04; C = 0.92 ± 0.02; p < 0.05) e da fração de encurtamento sistólico (F = 53,5 ± 5%; C = 56.7 ± 4.2%; p < 0.05). Em adição, foi verificada diferença estatisticamente significante no diâmetro sistólico do ventrículo esquerdo (F = 3.71 ± 0.51 mm; C = 3.39 ± 0.4 mm; p < 0.05). Não houve diferença nas outras variáveis ecocardiográficas estudadas.

Em relação ao estudo funcional por meio da avaliação do músculo papilar, não foram encontradas diferenças entre os grupos. A principal característica desse método é que ele avalia a função miocárdica sem interferência de fatores externos, como a freqüência cardíaca e a pré e pós-carga. Desse modo, podemos concluir que não houve alteração nas propriedades mecânicas intrínsicas do miocárdio. Por outro lado, no estudo ecocardiográfico, observamos aumento do diâmetro sistólico final do ventrículo esquerdo no grupo fumante, acompanhado por menor fração de ejeção e encurtamento sistólico. Esses dados sugerem que apesar da preservação da função muscular, os ratos expostos à fumaça do cigarro têm diminuição da função sistólica da câmara ventricular. Uma das explicações prováveis para este fato diz respeito à estimulação adrenérgica e a liberação de endotelina provocada pela nicotina, que podem causar retenção de sódio e água. Em conseqüência, haveria alteração nas condições de carga a que o coração é submetido. Entretanto, neste estudo não houve diferença entre os grupos quanto ao peso corporal dos animais e na relação peso seco e peso úmido dos diferentes órgãos estudados (coração, pulmão e fígado). Assim, acreditamos que a retenção de sódio e água não teve influência em nossos resultados. Outra explicação possível diz respeito à vasoconstrição relacionada ao tabagismo, efeito cardiovascular já conhecido, em conseqüência da liberação de catecolaminas pelas terminações nervosas centrais e de endotelina-1. Assim, embora a contratilidade permaneça inalterada, a depressão da função ventricular esquerda poderia resultar das alterações no tônus vascular, com conseqüente aumento da pós-carga.

Novo estudo foi, então, realizado com delineamento semelhante, com o objetivo de avaliar se esse efeito nas variáveis cardíacas se mantinha após a exposição crônica à fumaça do cigarro por 4 meses.14 Neste estudo, ao analisarmos as variáveis corporais, observamos menor relação entre o peso úmido e peso seco do VE nos ratos fumantes, em relação aos animais controle (F = 79.63 ± 0.51; C = 80.97 ± 118 p < 0.05). Não houve diferença quanto às outras variáveis corporais estudadas (peso corporal, peso do VE, peso do VD, peso VE ajustado ao peso corporal, peso do VD ajustado ao peso corporal, relação entre peso seco e úmido do VD, relação entre peso úmido e seco do fígado). No estudo ecocardiográfico, encontramos aumento do átrio esquerdo (F = 4.2 ± 0.7 mm; C = 3.5 ± 0.6 mm; p < 0.05), aumento nos diâmetros ventriculares sistólicos (F = 4.1 ± 0.5 mm; C = 3.4 ± 0.5 mm; p < 0.05) e diastólicos nos ratos fumantes (F = 7.9 ± 0.7 mm; C = 7.2 ± 0.5 mm; p < 0.05), mesmo após ajuste para o peso corporal. Novamente, foi observado que a fração de ejeção (F = 0.85 ± 0.03; C = 0.89 ± 0.03; p < 0.05) e fração de encurtamento sistólico (F = 47.8 ± 3.7%; C = 52.7 ± 4.6%; p < 0.05) foram maiores no grupo controle. Em relação à avaliação da função diastólica, não houve diferença na onda E, onda A e na relação E/A entre os dois grupos. Dessa forma, após a exposição prolongada à fumaça do cigarro (4 meses), observamos alterações morfológicas e funcionais no coração, comprovando os efeitos deletérios do fumo já demonstrados com a exposição por um mês.

Os níveis pressóricos foram avaliados e o grupo exposto à fumaça de cigarro apresentou, após 3 meses de exposição, aumento da pressão sistólica caudal, em relação ao grupo controle (F = 118 ± 15 mm Hg, C = 103 ± 16 mm Hg; p < 0.05). Esse fenômeno pode sugerir que a ativação de fatores neurohumorais tenha participação nas alterações morfológicas e funcionais encontradas, embora os níveis pressóricos não sejam tão altos, para justificar as alterações, como os encontrados em outros modelos.18

Outro dado relevante desse estudo refere-se ao fato de que a eficiência da exposição dos animais à fumaça do cigarro foi confirmada, pela maior concentração de carboxihemoglobina nos ratos fumantes, após um mês de exposição, comparado ao rato controle (F = 5.3 ± 2.8%; C = 0.9 ± 0.7%; p < 0.05).

A próxima etapa de nossos estudos foi avaliar a influência do tempo da exposição à fumaça do cigarro no processo de remodelação ventricular em ratos.15 Para isso, os animais foram distribuídos em 4 grupos: controle, acompanhado por dois meses (I), expostos à fumaça do cigarro por dois meses (II), controle acompanhado por quatro meses (III) e expostos à fumaça do cigarro por quatro meses (IV). Após o período de observação foi realizado estudo ecocardiográfico. Os animais submetidos à exposição à fumaça do cigarro (II e IV) apresentaram maiores valores de átrio esquerdo (I e III = 3.46 ± 0.1 mm; II e IV = 4.02 ± 0.1 mm; p < 0.05), diâmetro ventricular diastólico (I e III = 6.99 ± 0.1 mm; II e IV = 7.69 ± 0.1 mm; p < 0.05) e sistólico (I e III = 3.22 ± 0.1 mm; II e IV = 3.98 ± 0.1 mm; p < 0.05) e maior índice de massa do ventrículo esquerdo (I e III = 1.35 ± 0.04 mm; II e IV = 1.59 ± 0.04 mm; p < 0.05). A relação entre a espessura e o diâmetro diastólico do ventrículo esquerdo foi menor nos animais fumantes (I e III = 0.19 ± 0.05 mm; II e IV = 0.17 ± 0.05 mm; p < 0.05). Observamos, também, menor fração de ejeção (I e III = 0.90 ± 0.01 mm; II e IV = 0.86 ± 0.01 mm; p < 0.05) e porcentagem de encurtamento (I e III = 54.1 ± 0.9 mm; II e IV = 48.3 ± 0.9 mm; p < 0.05) nos animais fumantes. Não houve diferença entre os animais expostos à fumaça por 2 e 4 meses. Concluímos, portanto, que a exposição á fumaça do cigarro resulta em remodelação ventricular com piora da função sistólica e que essas alterações independem do tempo de exposição.

Um dos mecanismos propostos para a remodelação ventricular induzida pelo fumo, diz respeito ao estresse oxidativo, já que este tem participação na disfunção endotelial, e também, no envolvimento molecular que controla a inflamação e pode induzir alterações funcionais e estruturais nos miócitos. Assim, em outro trabalho,19 analisamos o efeito da exposição à fumaça do cigarro por um mês em combinação com suplementação com beta-caroteno, que apresenta ação antioxidante. Os animais submetidos à exposição à fumaça do cigarro (F) apresentaram menor débito cardíaco, maior diâmetro ventricular diastólico esquerdo e maior peso do átrio e do ventrículo esquerdo comparado ao controle (C). Com a suplementação de beta-caroteno nos animais submetidos à exposição à fumaça do cigarro (BC+F), ocorreu atenuação dos valores das variáveis: peso do VE, VD e átrio, corrigidas pelo peso corporal. As alterações ultra-estruturais foram avaliadas por meio da microscopia eletrônica. Nos animais fumantes foram encontradas as seguintes alterações: desorganização ou ausência de miofilamentos, irregularidades na membrana plasmática, dilatação do reticulo sarcoplasmático, mitocôndrias polimórficas, edemaciadas e com diminuição de cristas. Entretanto, no grupo BC+F, a maioria das fibras apresentavam aspectos morfológicos normais, indicando que a suplementação com beta-caroteno atenuou as alterações morfológicas e ultra-estruturais induzidas pela fumaça do cigarro. O mecanismo pelo qual o beta-caroteno atenuou o processo de remodelação não está completamente elucidado, mas pode estar relacionado com seu efeito em reduzir o estresse oxidativo no miocárdio.


Efeitos do fumo após o infarto do miocárdio

O infarto agudo do miocárdio é uma forma de agressão miocárdica que leva à remodelação ventricular, definida como uma série de modificações moleculares, celulares e intersticiais cardíacas, que vão se manifestar clinicamente por alterações no tamanho, na massa, na geometria e na função do coração. Em conseqüência, ocorre piora da função sistólica e maior risco de complicações, como formação de aneurisma e ruptura da parede ventricular.

Em nosso trabalho, a exposição de ratos, submetidos ao infarto do miocárdio experimental, à fumaça de cigarro intensificou as alterações morfológicas e funcionais cardíacas. Entretanto, observamos maior sobrevida no grupo de animais expostos à fumaça. Sabe-se, por meio de estudos epidemiológicos, que o tabagismo aumenta o risco de infarto do miocárdio. No entanto, alguns estudos sugerem que fumantes vítimas de infarto do miocárdio têm menor mortalidade.20-21 A esse fenômeno, dá-se o nome de efeito paradoxal do hábito de fumar. Com o intuito de confirmar o efeito do habito de fumar após o infarto do miocárdio realizamos estudos em ratos expostos à fumaça do cigarro e submetidos a infarto agudo do miocárdio experimental. O primeiro estudo22 avaliou os efeitos do tabagismo quando a exposição à fumaça do cigarro era iniciada antes do infarto agudo do miocárdio. O estudo também avaliou a influência de substância antioxidante nos efeitos causados pelo fumo. Desse modo, nosso estudo envolveu quatro grupos: grupo controle (C), grupo que recebeu beta caroteno (BC), escolhido como substância antioxidante, grupo exposto a fumaça do cigarro (EFC) e grupo que recebeu suplementação de beta-caroteno e foi exposto a fumaça do cigarro (BC+EFC). Após 5 semanas, os animais foram submetidos a infarto experimental através da ligadura da artéria coronária esquerda e, após 105 dias, foram realizados estudos funcionais, bioquímicos e morfológicos. Foi observado que a sobrevida dos animais no grupo EFC foi maior que no grupo controle (EFC = 58.2%, C = 33.3%, p < 0.05), confirmando a teoria do efeito paradoxal do cigarro.20-21 Um dos possíveis mecanismos para explicar a diminuição de mortalidade no grupo exposto à fumaça do cigarro seria semelhante ao pré-condicionamento isquêmico. No pré-condicionamento isquêmico, curtos períodos de isquemia tornariam o miocárdio mais resistente aos novos insultos.23,24 A sobrevida no grupo EFC também foi superior ao grupo BC+EFC (EFC = 58.2%, BC+EFC = 30.0%, p < 0.05). Uma explicação para esse resultado é a participação de radicais livres no pré-condicionamento isquêmico, após breves períodos de isquemia ocorre aumento dos radicais livres, insuficientes para causar necrose celular, entretanto capazes de provocar alterações celulares. A administração de uma substância antioxidante, no caso o beta-caroteno, atenuaria o pré-condicionamento isquêmico, e portanto o papel protetor do cigarro estaria abolido.

O segundo estudo25 avaliou os efeitos do tabagismo quando a exposição à fumaça do cigarro era iniciada após o infarto experimental. Assim, após 48 h, os ratos foram separados em grupo controle (C) e grupo fumante (F). O grupo fumante foi exposto á fumaça do cigarro, por método descrito anteriormente, por período de 6 meses. Não houve diferença na mortalidade durante o período de observação (F = 50%, C = 58%; p > 0.05). Após 6 meses, a exposição à fumaça do cigarro resultou em alterações morfológicas do ventrículo esquerdo, caracterizadas pelo aumento da área seccional dos miócitos (F = 253.9 ± 7.9 μm2, C = 239.8 ± 5.8 μm2; p < 0.05) indicando hipertrofia cardíaca. Essa alteração foi associada a maiores áreas ventriculares, tanto sistólica (F = 1.32 ± 0.4 mm2, C = 1.05 ± 0.3 mm2; p = 0.08), como diastólica (F = 1.9 ± 0.4 mm2, C = 1.5 ± 0.4 mm2 p = 0.08) do VE, sugerindo intensificação do processo de remodelação ventricular esquerda com a exposição à fumaça. Em adição, houve queda da função sistólica, avaliada pela fração de variação de área, (F = 25.5 ± 7.6%, C = 31.9 ± 9.3% p = 0.08), e diastólica, observada pela derivada negativa de pressão (-dp/dt) (F = 916 ± 261 mm Hg, C = 1 474 ± 397 mm Hg; p < 0.05), no grupo fumante.


Conclusão

Os resultados alcançados pelo conjunto de nossos estudos indicam que a exposição à fumaça do cigarro resulta em alterações cardíacas, tanto morfológicas como funcionais. Estas alterações podem estar, pelo menos em parte, relacionadas ao estresse oxidativo e ativação neurohormonal.



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