HEPATOSPLENIC SCHISTOSOMIASIS: DOPPLER SONOGRAPHY FINDINGS
Artículo completo Figura 1. Exame macroscópico do fígado mostrando intenso espessamento periportal devido a fibrose.Fisiopatologia Após a penetração na pele, os parasitas, em forma de cercárias, são levados ao pulmão e por meio da circulação sistêmica atingem o fígado, local onde amadurecem e se acasalam. Posteriormente, ocorre a sua migração, contra a corrente de fluxo, para as veias mesentéricas e para a submucosa intestinal, onde é feita a ovoposição. A evolução da doença no fígado se faz por meio da embolização de ovos do parasita, a partir da submucosa intestinal, para os ramos da rede venosa portal e os ovos se implantam no interior do lúmen vascular.3,11 A reação inflamatória à presença dos ovos, assim como, às vezes, do parasita morto, induz à formação de granulomas epitelióides crônicos e à fibrose periportal de Symmers, um espessamento fibroso dos espaços portais, que produz um bloqueio pré-sinusoidal ao fluxo sanguíneo sem envolvimento da região centrilobular.8 Com a evolução da doença, a fibrose periportal progride em graus variados e estabelece uma obstrução (amputação) venular dos ramos portais intra-hepáticos que são substituídos por uma extensa rede de colaterais de fino calibre observados ao exame angiográfico (Sinal de Bogliolo) que contribuem para o estado de hipertensão portal pré-sinusoidal.1,11 A arquitetura geral do lóbulo hepático é preservada e nódulos de regeneração não são encontrados nas formas puras da esquistossomose hepatoesplênica. A ocorrência de nódulos está associada à redução da perfusão hepática conseqüente aos sucessivos episódios de hemorragia digestiva alta ou em casos que a esquistossomose se associa à hepatite crônica ativa de origem viral ou alcoólica.10 Diagnóstico por imagem Os aspectos morfológicos e biométricos da forma hepatoesplênica da esquistossomose podem ser estudados por diversos métodos de diagnóstico por imagem, tais como: ultra-sonografia Doppler (US-Doppler), cintilografia, tomografia computadorizada, esplenoportografia e ressonância magnética. Os aspectos anatomo-patológicos podem ser reconhecidos mediante o estudo por ultra-sonografia Doppler, precedendo, por vezes, o início das manifestações clínicas da doença.6 Além disso, a US-Doppler apresenta as vantagens por não ser invasiva, ter baixo custo e ser acessível à maioria dos pacientes, tornando-se uma etapa importante na prática da medicina diagnóstica moderna. Tem sido aplicado em uma série de estudos epidemiológicos populacionais, em regiões de alta prevalência da esquistossomose hepato-esplênica. Esta identificação permite o diagnóstico precoce, o tratamento e evita as complicações futuras. Nos pacientes submetidos ao tratamento clínico, a ultra-sonografia possibilita o seguimento da fibrose periportal. A redução pode ocorrer em até 33% dos pacientes e o desaparecimento da fibrose pode ocorrer em 25% dos casos.12 Os aspectos morfológicos e os parâmetros hemodinâmicos obtidos através da ultra-sonografia Doppler, tornam possíveis o diagnóstico da hipertensão portal de origem esquistossomótica e de suas complicações vasculares.6,13-15 O fígado apresenta hipertrofia do lobo esquerdo, atrofia do lobo direito (figura 2), bordas rombas e espessamento fibroso dos espaços porta de até cerca de 3 cm. O espessamento fibroso periportal é mais intenso no hilo hepático, estendendo-se em graus variados para os espaços portais intra-hepáticos e para a região perivesicular.3 O lobo caudado se apresenta com dimensões normais, diferente do observado em pacientes portadores de cirrose viral que apresentam hipertrofia deste lobo e atrofia do segmento IV em grande parte dos casos.3,16 As veias hepáticas são arqueadas, com reduzida ramificação e ocorre dilatação das veias esplênica e porta em virtude da hipertensão portal.17 ![]() Figura 2. Alteração volumétrica do fígado observando-se aumento acentuado do lobo esquerdo e redução do lobo hepático direito.O aumento do lobo hepático esquerdo e a redução do lobo hepático direito observados na esquistossomose hepatoesplênica parece estar relacionado às diferenças hemodinâmicas entre os volumes de fluxo mesentérico e esplênico.18 O espessamento fibroso periportal é caracterizado pela ultra-sonografia como uma faixa de hiperecogenicidade periportal ao longo do maior eixo da veia porta e seus ramos em cerca de 73% a 100% dos casos. Este espessamento acomete principalmente a veia porta no hilo hepático, estendendo-se para os ramos portais intra-hepáticos e para a região perivesicular.3,5,15 ![]() Figura 3. Esplenomegalia, com copúsculos de Gamna-Gandi (pontos hiperecogênicos distribuídos no parênquima hepático).A fibrose perivesicular ocorre em 60% a 81% dos casos e, em casos leves envolve apenas o colo sem envolvimento de outras porções da parede vesicular. Ao contrário de outras hepatopatias crônicas, na esquistossomose hepatoesplênica, a litíase da vesícula biliar é observada em pequena porcentagem dos casos (2.9%)3 (figuras 4 e 5). ![]() Figura 4. Espessamento fibroso periportal observado tanto no hilo hepático quanto nos ramos intra-hepáticos. ![]() Figura 5. Espessamento fibroso periportal observado no hilo hepático e na região perivesicular.Em aproximadamente 11% dos casos observa-se granulomas hepáticos fibróticos dispersos pelo parênquima. Ocasionalmente, o granuloma pode ser único, semelhante a outros nódulos solitários do fígado.3 Outro aspecto de acometimento do fígado, comum no Egito e raro no Brasil são a “hashem’s fine diffuse bilharzial fibrosis”.11 A esplenomegalia está presente em 90% a 100% dos indivíduos provenientes de regiões endêmicas, mas pode estar ausente nas fases inicias da esquistossomose hepatoesplênica. Os nódulos de hemossiderina (corpúculos de Gamna-Gandi) são observados em apenas 7% dos pacientes e evidenciados como pontos hiperecogênicos (3 a 15 mm) dispersos no parênquima esplênico.3,6 A gênese da esplenomegalia se deve à dilatação sinusoidal conseqüente à hipertensão portal e à proliferação das células do sistema reticulo-endotelial em resposta aos ovos e aos produtos do schistosoma19 (figura 3). ![]() Figura 6. Mapeamento colorido da veia porta demonstra fluxo hepatopetal e aumento do diâmetro (= 1.4 cm), devido a hipertensão portal. ![]() Figura 7. Aumento do diâmetro da veia esplênica (= 1.3 cm) devido a hipertensão portal.A hipertensão portal na esquistossomose é do tipo pré-sinusoidal. Em sua decorrência observa-se freqüentemente aumento do calibre das veias porta (> 1.2 cm), esplênica (> 0.9 cm) e mesentérica superior (0.9 cm) em, respectivamente, 73%, 68% e 42% dos casos3,20 (figuras 6 e 7). A velocidade na veia porta se encontra dentro dos padrões da normalidade (figura 8) e algumas oscilações de fluxo podem ser observadas, repercutindo movimentos cardíacos e respiratórios. A presença de trombose da veia porta é rara (6%), mas de grande importância prognóstica para o paciente. Localiza-se preferencialmente no tronco principal e/ou nos seus ramos, preenchendo sua luz com material ecogênico, obstruindo total ou parcialmente o vaso. Na presença de trombose completa, o mapeamento colorido não caracteriza fluxo, todavia, na trombose parcial evidencia-se fluxo na região periférica da veia3,21,22 (figuras 9 a 12). ![]() Figura 8. Dúplex-Doppler colorido mostra fluxo hepatopetal na veia porta, com morfologia do traçado espectral e velocidade preservadas (= 23 cm/s). ![]() Figura 9. Trombose parcial da veia porta, com material ecogênico no seu interior. ![]() Figura 10. Mapeamento colorido demonstra trombose da veia porta (crônica), identificando-se circulação colateral no hilo hepático, representada pela presença de imagens anecogênicas serpiginosas nesta região (transformação cavernomatosa). ![]() Figura 11. Trombose portal completa, com material hipoecogênico dentro da veia porta (trombose recente). ![]() Figura 12. Doppler de amplitude mostra trombose completa da veia porta (crônica) observando-se circulação colateral nesta região, representada por imagens serpiginosas (transformação cavernomatosa).Nos casos de trombose crônica pode ocorrer transformação cavernomatosa da veia porta, representada pela identificação de vasos tortuosos na sua topografia, (circulação colateral). O US-Doppler demonstra estrutura alongada, ecogênica, permeada por imagens serpiginosas com fluxo de baixa velocidade (espectro achatado), sem as alterações ondulatórias decorrentes do ciclo cardíaco (fluxo monofásico)21 (figuras 10 e 12). A trombose da veia porta e da veia esplênica pode ocorrer como complicação secundária ao tratamento de escleroterapia das varizes esofagianas e após cirurgias de derivação mesentérico-cava, porto-cava, esplenorrenal distal ou desconexão ázigo-portal e esplenectomia (DAPE)20 (figura 13). ![]() Figura 13. Doppler de amplitude demonstra derivação cirúrgica porto-cava (A) e mesentérico-cava (B). ![]() Figura 14. Anastomose esplenorrenal espontânea demonstrada pelo US-Doppler colorido.A circulação venosa colateral é evidenciada em 36 a 78% dos pacientes. A veia gástrica esquerda pode ser identificada como uma veia tortuosa que emerge da veia esplênica ou da veia mesentérica superior próximo à pequena curvatura gástrica e ao plexo gastro esofágico junto ao bordo do lobo hepático esquerdo (figuras 16 e 17). As veias gástricas curtas são visíveis junto ao fundo gástrico e ao hilo esplênico (figura 18). A veia paraumbilical é visível ao longo do ligamento redondo com diâmetro e extensão variável até ramos da veia epigástrica inferior junto a parede abdominal antero-inferior (figuras 19 a 21). ![]() Figura 15. Mapeamento colorido mostra circulação venosa colateral no hilo hepático, sem trombose portal. ![]() Figura 16. Mapeamento colorido mostra circulação venosa colateral (veia gástrica esquerda)..Outras colaterais podem ser demonstradas pelo ultra-som: as retroperitoneais, as veias císticas junto à parede da vesícula biliar (figura 21) e eventualmente a anastomose esplenorenal espontânea.3,21,23 (figura 14). Eventualmente, nos casos de anastomose espleno-renal espontânea, o fluxo nas veias porta e esplênica pode ser hepatofugal.23 As veias hepáticas podem apresentar alteração do padrão espectral em decorrência da redução da complacência do parênquima hepático (pela fibrose), passando a ter fluxo bifásico ou monofásico (“portalizado”).10,14 ![]() Figura 17. US-Doppler colorido mostra circulação venosa colateral (veia gástrica esquerda). ![]() Figura 18. US-Doppler colorido (A) e Doppler de amplitude (B) mostra circulação venosa colateral (veias gátricas curtas).As hemotransfusões são freqüentes em decorrência dos sucessivos episódios de hemorragia digestiva alta por ruptura das varizes gastro-esofágicas. Conseqüentemente a associação com cirrose viral (vírus da hepatite B ou C) pode ocorrer. Nestes casos, deve-se considerar a superposição dos achados ultra-sonográficos da cirrose viral com os da doença esquistossomótica. A ascite, infreqüente em pacientes com esquistossomose hepatoesplênica pura, pode ser encontrada em pacientes com cirrose viral associada e com hepatocarcinoma.10 ![]() Figura 19. US-Doppler colorido mostra circulação venosa colateral (veia paraumbilical). ![]() Figura 20. Dúplex-Doppler colorido mostra circulação venosa colateral (veia paraumbilical).No diagnóstico diferencial da esquistossomose hepatoesplênica devem ser consideradas a cirrose hepática, a hepatite aguda, a fibrose hepática congênita e a colangite oriental. A cirrose hepática apresenta-se com padrão nodular, ecotextura heterogênea, aumento da atenuação do feixe sonoro e por vezes com hipertrofia do lobo caudado e redução do segmento IV.3,16 O espessamento fibroso periportal da cirrose é menos intenso e se limita ao tronco principal e o baço, embora aumentado na cirrose, não atinge as dimensões observadas na esquistossomose. Na hepatite aguda o espessamento periportal e da parede da vesícula biliar é discreto e a alteração das enzimas hepáticas e exames sorológicos específicos fazem o diagnóstico diferencial nos casos de hepatites agudas virais. ![]() Figura 21. Mapeamento colorido mostra circulação venosa colateral com fluxo hepatofugal na veia paraumbilical. ![]() Figura 22. Fibrose perivesicular, representada por tecido hiperecogênico (A) e mapeamento colorido mostrando circulação venosa colateral (varizes císticas) (B).O tratamento cirúrgico da hipertensão portal de origem esquistossomótica está bem estabelecido através das derivações venosas, mas a realização da anastomose porto-sistêmica intra-hepática trans-jugular (TIPS) poderá ser uma alternativa ao tratamento dos pacientes com esquistossomose portadores de varizes de esôfago e da ascite refratária. Algumas particularidades da esquistossomose, como a atrofia do lobo direito e a fibrose periportal intensa dificultam o procedimento e como já demonstrado podem aumentar as complicações. Atualmente diante dos custos envolvidos, o TIPS é uma alternativa terapêutica não aplicável em larga escala nestas áreas endêmicas.1 Conclusão O ultra-som é uma ferramenta diagnóstica de grande valor no estudo da esquistossomose. Pode ser utilizada em estudos epidemiológicos de campo e no diagnóstico da forma hepatoesplênica da esquistossomose mansônica cujos aspectos são característicos. Os achados diagnósticos que identificam a forma pura da doença são: fibrose periportal e perivesicular, atrofia do lobo direito e hipertrofia do lobo esquerdo e esplenomegalia. Nas formas associadas as hepatites virais deve-se descartar a possibilidade do hepatocarcinoma, e, a ascite pode complicar o quadro clínico nestas formas. O Doppler deve ser utilizado no estudo do fluxo do sistema porta, no diagnóstico das complicações como a trombose; no diagnóstico da circulação colateral e no seguimento dos pacientes submetidos ao tratamento cirúrgico ao analisar a anastomose venosa de modo não invasivo. Los autores no manifiestan conflictos.
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