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PICA EM GESTANTES ADOLESCENTES
(especial para SIIC © Derechos reservados)
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saunders9.jpg Autor:
Cláudia Saunders
Columnista Experta de SIIC

Institución:
Universidade Federal do Rio de Janeiro

Artículos publicados por Cláudia Saunders 
Coautores
Marta Maria A de Souza Santos* Mirian Ribeiro Baião** Eliana Milagres*** Elisabete Queiróz Caldeira Neves**** Ana Carolina Ayeta*** Denise Cavalcante de Barros***** 
Nutricionista. Doutora em Nutrição, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Río de Janeiro, Brasil*
Nutricionista. Doutora em Ciências, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Río de Janeiro, Brasil**
Nutricionista, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Río de Janeiro, Brasil***
Nutricionista. Mestre em Nutrição, Universidade Federal do Rio de Janeiro, Río de Janeiro, Brasil****
Nutricionista. Doutora em Ciências, Escola Nacional de Saúde Pública-Fiocruz, Rio de Janeiro, Brasil*****

Recepción del artículo: 27 de septiembre, 2011

Aprobación: 8 de marzo, 2012

Primera edición: 7 de junio, 2021

Segunda edición, ampliada y corregida 7 de junio, 2021

Conclusión breve
Descrever a prevalência de picamalácia entre gestantes adultas e adolescentes do Rio de Janeiro, Brasil e, avaliar a sua associação com as intercorrências gestacionais (anemia gestacional, cegeuira noturna, sintomatologia digestiva) e condições ao nascer (peso, idade gsetacional ao nascer e intercorrências neonatais)

Resumen

Objetivo: Descrever a pica em gestantes adolescentes e o efeito desse comportamento no resultado perinatal. Métodos: Estudo longitudinal com 227 gestantes/puérperas adolescentes e seus recém-nascidos, realizado no período de 2007 a 2010. Os dados foram coletados por consulta aos prontuários e por entrevista padronizada para identificação do comportamento de pica. Resultados: A pica foi referida por 19.8% das adolescentes. Comparando-se as gestantes com e sem o comportamento de pica constatou-se, respectivamente, que a média do ganho de peso no terceiro trimestre (4.87 kg e 6.10 kg; p = 0.019), o ganho de peso no segundo e terceiro trimestres (10.07 kg e 11.58 kg; p = 0.039) e o ganho de peso semanal no terceiro trimestre (0.42 kg e 0.53 kg; p = 0.010) foram significativamente menores na presença desse comportamento. A pica foi mais prevalente nas adolescentes com menor idade (p = 0.000) e condições de saneamento inadequado na moradia (p = 0.007). A pica não associou-se à: adequação do ganho de peso gestacional, intercorrências gestacionais, anemia, peso e idade gestacional ao parto e intercorrências dos recém-natos. Conclusão: O comportamento de pica deve ser investigado no pré-natal e reconhecido como fator de risco para menor ganho de peso gestacional dentre as gestantes adolescentes.

Palabras clave
gestante adolescente, pica, transtorno alimentar, cuidado pré-natal

Clasificación en siicsalud
Artículos originales> Expertos del Mundo>
página www.siicsalud.com/des/expertos.php/122647

Especialidades
Principal: NutriciónObstetricia y Ginecología
Relacionadas: Atención PrimariaEpidemiologíaMedicina FamiliarPediatríaSalud Pública

Enviar correspondencia a:
Cláudia Saunders, 22290-160, Botafogo, Brasil

Pica in Pregnant Adolescents

Abstract
Objective: To describe pica in pregnant adolescents and the effect of this behavior in perinatal outcome. Methods: A longitudinal study of 227 pregnant/teenage mothers and their newborns was conducted between 2007 to 2010. Data were collected by consulting the medical records and standardized interviews were performed to identify pica behavior. Results: Pica was reported in 19.8% of the adolescents. By comparing pregnant women with and without pica behavior, the average weight gain was 4.87 kg and 6.10 kg (p = 0.019) in the third trimester, 10.07 kg and 11.58 kg (p = 0.039) in the second and third semesters, with a weekly weight gain of 0.42 kg and 0.53 kg (p = 0.010) in the third trimester, respectively. The weight gain was significantly lower in the presence of this behavior in all cases

Pica was more prevalent among younger adolescents (p = 0.000) and inadequate sanitation in the household (p = 0.007). Pica was not associated with proper gestational weight gain, pregnancy complications, anemia, weight and gestational age at birth and complications of newborns. Conclusion: Pica behavior should be investigated during prenatal stage and recognized as a risk factor for lower gestational weight gain among pregnant adolescents.


Key words
teenage pregnancy, pica, eating disorders, prenatal care

PICA EM GESTANTES ADOLESCENTES

(especial para SIIC © Derechos reservados)

Artículo completo
Introdução
A gravidez na adolescência é um fenômeno mundial mais prevalente nos grupos social e economicamente mais vulneráveis e de menor escolaridade, sendo na maioria das vezes não planejada.1 Nesse sentido, a gestação na adolescência comumente encontra-se associada com anemia, baixo peso materno, carências nutricionais e transtornos emocionais, que podem agravar os riscos de intercorrências maternas e perinatais.2,3
A pica é um transtorno alimentar que se manifesta pela ingestão compulsiva e persistente de sustâncias geralmente não alimentares ou com muito pouco valor nutritivo e destaca-se pelo impacto desfavorável na saúde materna, propiciando o desenvolvimento de anemia na gestação,4 que pode ter impacto também no desenvolvimento fetal.5,6

Vários termos são utilizados para descrever esse problema, tais como pica, picamalácia, picacia, picacismo, malácia, geomania, pseudorexia, todos com diferentes graus de descontrole do apetite.4,7-9 Outra definição é sugerida por Belfort,10 que define como pica o gosto por alimentos esdrúxulos, condimentos raros ou por substâncias estranhas, tais como pagofagia (ingestão de gelo), a geofagia (ingestão de terra ou barro), amilofagia (ingestão de goma, principalmente a de lavanderia), o consumo de miscelâneas (combinações atípicas), frutas verdes, palitos de fósforo queimados, cabelo, pedra e cascalho, carvão, fuligem, cinzas, dentre outros.8,9,11,12 Tal problema á considerado quando o comportamento não faz parte de uma prática cultural e não ocorre exclusivamente durante o curso de transtorno mental.13
O comportamento de pica, incluído na Classificação Internacional de Doenças (CID-10) como um transtorno da alimentação que acomete crianças e gestantes,7 vem ganhando destaque na literatura internacional pelas prevalências encontradas, principalmente no grupo materno-infantil, e pela associação com outros agravos à saúde.8,9,12-17

As consequências da pica para o binômio mãe-filho podem variar conforme a natureza da substância ingerida. Na gestação, o comportamento de pica pode associar-se com feridas na boca, anemia, disfunções intestinais, problemas dentários, infecções parasitárias, toxoplasmose, síndromes hipertensivas na gravidez, interferências na absorção de nutrientes, envenenamento por chumbo e hipercalemia.4,7,9,11,16,17 E, dentre os efeitos desse comportamento para o concepto, podemos apontar associação com parto prematuro, baixo peso ao nascer, irritabilidade do neonato, perímetro cefálico fetal diminuído, exposição fetal a substâncias químicas, tais como, chumbo, pesticidas e herbicidas, e por fim, aumentar o risco de morte perinatal.7,16,18

A etiologia da pica é pouco compreendida e sua complexidade também é reconhecida. Várias teorias são formuladas para explicar esse comportamento, dentre elas, a teoria de deficiência de nutrientes essenciais, como cálcio e ferro, levando essas gestantes à ingestão de substâncias não alimentares, que contém esses minerais em sua composição. Sugere-se que tal comportamento pode interferir no estado nutricional, reduzindo a ingestão de substâncias alimentares e, conseqüentemente, levando à inadequação na ingestão de nutrientes essenciais pela gestante, como ferro.8

O comportamento de pica em gestantes pode estar relacionado ainda a fatores culturais (tradições familiares, crenças e superstições alimentares), ambientais (clima e condição socioeconômica), fisiológicos (alívio de sintomatologia digestiva) emocionais (alterações hormonais que ocorrem durante a gravidez, com alterações no apetite e vontades específicas) e psicológicos.7,9,11,15,16,18

Face às repercussões desse transtorno alimentar na saúde da gestante e do concepto, o presente estudo tem como objetivo descrever a pica em gestantes adolescentes brasileiras e avaliar seu efeito no resultado perinatal.


Metodologia

O desenho do estudo é longitudinal prospectivo realizado com 227 gestantes/puérperas adolescentes e seus recém-nascidos atendidos em uma maternidade pública do município do Rio de Janeiro, Brasil, no período de 2007-2010.
A maternidade estudada atende gratuitamente gestantes de baixo e médio risco, que apresentam as mesmas características da clientela de mulheres adultas e adolescentes, atendida em outras unidades de saúde do município do Rio de Janeiro.19,20
Foram estudadas gestantes adolescentes com idade cronológica < 20 anos, com início da assistência pré-natal até a 16ª semana gestacional e de gestação de feto único. Foram excluídas as com enfermidades crônicas e as de gestação gemelar. Todas as gestantes foram acompanhadas pelo serviço de pré-natal da unidade, incluindo acompanhamento nutricional, com pelo menos 4 consultas com o nutricionista.
Na assistência nutricional pré-natal realizou-se avaliação nutricional detalhada incluindo a investigação do comportamento de pica e considerou-se como comportamento de pica presente quando a gestante referia a ingestão de substâncias não alimentares e combinações atípicas de alimentos na gestação. Para a identificação dos casos, empregou-se a entrevista padronizada4 em todas as consultas com o nutricionista.

Na identificação dos casos de pica, o nutricionista procurava investigar problemas emocionais, familiares ou de outra ordem, que pudessem estar associados e, por meio do aconselhamento nutricional, buscava fazer com que esse comportamento fosse superado, incentivando a gestante a consumir alimentos de sua preferência, sempre que esse “desejo” se manifestasse. Também houve a negociação e sugestão para que a gestante evitasse o contato com a substância “desejada”, além do esclarecimento sobre os possíveis riscos associados a esse comportamento.4,21

Para avaliação antropométrica materna calculou-se o Índice de Massa Corporal (IMC) pré-gestacional com base no peso pré-gestacional, informado ou medido até a 13ª semana gestacional e estimou-se o ganho de peso gestacional total. Os valores de IMC pré-gestacional foram comparados com os propostos pela Organização Mundial da Saúde22 para meninas de 5 a 19 e, adotou-se na classificação do IMC os pontos de corte propostos pelo Ministério da Saúde 23 e adaptados.24

O ganho de peso gestacional total foi calculado por meio de subtração do peso pré-parto ou do registrado na última consulta da assistência pré-natal do peso pré-gestacional. O ganho de peso no primeiro trimestre foi calculado pela subtração do peso até a 14ª semana de gestação do peso pré-gestacional; do segundo trimestre pela subtração do peso na da 28ª semana do peso na 14ª semana e; o do terceiro trimestre pela subtração do peso pré-parto ou da última consulta da assistência pré-natal do peso na 28ª semana.
Na avaliação sociodemográfica, obstétrica e da assistência pré-natal foram avaliadas as características –idade materna, situação marital, cor da pele, grau de instrução, condição de saneamento da moradia. Considerou-se condições adequadas de saneamento da moradia quando havia acesso à água tratada, à rede geral de esgoto e à coleta de lixo.

Quanto às condições dos recém-nascidos, avaliou-se o peso e idade gestacional ao nascer. O baixo peso ao nascer (BPN) foi definido como peso ao nascimento < 2 500 g. Foram considerados pré-termos os recém-nascidos com idade gestacional < 37 semanas, segundo a data da última menstruação (DUM).25
A coleta de dados ocorreu por pesquisadores treinados, reciclados e supervisionados, visando a padronização dos procedimentos. A coleta de informações foi realizada por meio de consulta aos prontuários e entrevista às gestantes, com preenchimento de protocolo pré-testado.

Na análise dos dados foram empregados os teste t-Student para testar a igualdade de duas médias. A homogeneidade das variâncias foi avaliada através da estatística Levene. O teste do qui-quadrado foi usado no estudo da associação entre as variáveis categóricas. O nível de significância adotado em todas as análises foi de 5% e todas as análises foram realizadas no pacote estatístico SPSS for windows versão 17.0.
O estudo (Programa de Acompanhamento Nutricional Pré-Natal para Gestantes Adolescentes) foi aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa da Maternidade Escola da Univeridade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, Brasil, em 29/junho/07 (CAAE – 1758.0.000.361-07) e todas as participantes assinaram o termo de consentimento livre e esclarecido (Anexo 1).


Resultados

A idade média das adolescentes estudadas foi de 17.2 anos (desvio padrão [DP[ = 1.57), sendo que 7.5% tinham até 15 anos e o IMC médio foi 21.85 kg/m2 (DP = 3.41). A maioria das gestantes era de cor parda (47.1%) e não viviam com o companheiro (58.4%). A avaliação do grau de escolaridade indica que 42.5% das adolescentes amostra apresentava o ensino fundamental completo e 93.3% das entrevistadas residia em moradia com condições de saneamento adequadas.
Em relação ao IMC pré-gestacional, verificou-se que 4.5% das adolescentes apresentavam baixo peso e 15.1% sobrepeso/obesidade. A adequação do ganho de peso gestacional total foi observada em 32.4%, enquanto que o ganho de peso acima do recomendado prevaleceu em 41.0% das adolescentes. Quanto às condições ao nascer dos conceptos, a média de peso e idade gestacional ao nascer foi de 3 211.3 g (DP = 450.67) e 39.03 semanas (DP = 1.85), segundo a data da última menstruação. A prevalência de prematuridade foi de 12.6% e de BPN foi de 4.0%.
Dentre as entrevistadas, 19.8% (n = 45) relataram ter o comportamento de pica durante a gestação, das quais 25.7% referiram que esse comportamento ocorria diariamente, 14.3% semanalmente e 11.4% três vezes por semana. Os alimentos ou produtos mais consumidos pelas gestantes foram: fruta com sal (51.2%); fruta verde com sal (9.3%); gelo e fruta com sal (4.7%); gelo (4.7%); tijolo e argila (2.3%); sabonete (2.3%), desinfetante com creme de cabelo com fruta com sal e vinagre (2.3%); detergente (2.3%); tijolo com rato (2.3%); pó de café (2.3%); areia de praia (2.3%); papelão (2.3%) e outros. A maioria das gestantes não soube informar os motivos que as levavam a desenvolver esse comportamento cuja frequência também foi relatada em gestação anterior por quase metade das adolescentes (48.4%).
A média de ganho de peso gestacional total foi de 13.87 kg (DP = 5.23) e as médias de ganho de peso gestacional para o primeiro, segundo e terceiro trimestre gestacional, foram respectivamente de, 2.32kg (DP = 3.55); 5.67kg (DP = 2.56); 5.88kg (DP = 2.88). Comparando-se as gestantes praticantes e as não praticantes de pica, constatou-se, respectivamente, que a média do ganho de peso no terceiro trimestre (4.87kg e 6.10kg; p = 0.019) e o ganho de peso no segundo e terceiro trimestre (10.07 kg e 11.58 kg; p = 0.039) foram significativamente menores dentre as que revelaram o comportamento de pica (Tabela 1). O ganho de peso semanal no terceiro trimestre foi significativamente menor dentre as praticantes de pica (0.42kg e 0.53kg; p = 0.010) em comparação às adolescentes que não relataram tal comportamento (Tabela 1).








O comportamento de pica não se associou com as características: situação marital (p = 0.414), cor da pele (p = 0.355), grau de instrução (p = 0.458). Por outro lado, foi maior a prevalência de pica dentre as adolescentes que residiam em moradia com condições inadequadas de saneamento (p = 0.007) e dentre as com menos de 15 anos (p = 0.000, Tabela 2). Confirmando tal achado, constatou-se menor média de idade dentre as praticantes de pica em comparação com as que não a praticavam (16.68 anos e 17.35 anos, p = 0.011). Verificou-se também que as praticantes de pica receberam menor número de consultas de pré-natal em comparação com as não praticantes (5.85 e 6.93 consultas, p = 0.014).








A pica não se associou com os desfechos maternos –adequação do ganho de peso gestacional total (p = 0.718), intercorrências gestacionais (p = 0.542) e anemia na gestação (p = 0.402). Em relação aos desfechos fetais, o comportamento de pica não se associou com a adequação do peso ao nascer (p = 0.831), com a idade gestacional ao nascer (p = 0.738) ou com intercorrências do recém-nascido (p = 0.592, Tabela 3).








Discussão

O estudo mostrou que cerca de 20% das gestantes adolescentes revelaram o comportamento de pica, um transtorno alimentar em que substâncias não nutricionais ou combinações atípicas são ingeridos com freqüência, representando risco à saúde da mãe e do feto. Essa prevalência é maior que a encontrada em estudo com gestantes adultas no Rio de Janeiro, Brasil (14.4%)4 e, muito menor que as documentadas em pesquisas realizadas em algumas partes da África. Nyaruhucha,8 em estudo para determinar a freqüência e a duração de desejos alimentares, aversões e pica durante a gravidez em 204 mulheres grávidas e lactantes da cidade de Dar es Salaam, na Tanzânia, informou que a pica foi experimentada por 63.7% das mulheres. Também na Tanzânia, em Zanzibar, em um recente estudo com 2 368 gestantes, Young e col.9 revelam o comportamento de pica por 40.1% das mulheres. Mensah e col.,26 avaliando a prevalência de pica e de suas várias formas entre gestantes em Kumasi, Gana, identificaram esse cmportamento em 47% dessas mulheres. Dentre os tipos de substâncias envolvidas na pica, a pagofagia (compulsão por consumir gelo) e a geofagia (compulsão por consumir terra) foram as mais comuns entre as brasileiras e africanas.

Em relação à associação entre condições de saneamento na residência e o comportamento de pica avaliada no presente estudo, foi observada maior prevalência do transtorno alimentar dentre as adolescentes que residiam em moradia com condições inadequadas de saneamento. Este achado vai ao encontro dos relatos de diversos autores que referem dentre os possíveis fatores associados à ocorrência da pica, as infecções parasitárias e condições ambientais e econômicas, ao lado de outros fatores como anemia, problemas dentários, além de fatores culturais e emocionais.4,16, 27-29
No presente estudo comparou-se o ganho de peso materno (total por trimestre, total médio e velocidade de ganho semanal) das adolescentes com e sem pica durante a gestação e observou-se significativa redução dentre as que a praticavam. Verificou-se também neste estudo maior prevalência de pica dentre as gestantes adolescentes com menor idade. Recentes estudos têm demonstrado que gestantes adolescentes têm tendência a ganhar e reter mais gordura do que gestantes adultas, particularmente as mais jovens por conta do crescimento materno ainda em plena velocidade. Entretanto, apontam que mesmo na fase mais tardia da adolescência, quando o crescimento materno já não é tão intenso, especialmente no terceiro trimestre de gestação ocorre um contínuo acréscimo de gordura corporal materna.30,31 Nesse sentido, a ocorrência da pica pode inibir esse ganho de peso ótimo para a gestante adolescente, em particular das mais jovens. Vários autores apontam que o insuficiente ganho de peso gestacional pode influenciar negativamente o estado clínico da gestante, agravando problemas obstétricos e aumentando o risco de restrição do crescimento intrauterino e morbimortalidade perinatal.24,32-35

Durante a análise da literatura não foram encontrados estudos referentes aos efeitos adversos da ocorrência de pica durante a gestação sobre o ganho de peso materno, revelando a importância de tais estudos para que se possa verificar a necessidade de se traçar estratégias na assistência pré-natal para o seu diagnóstico precoce, evitando-se colocar mãe e filho em risco.15

Kachani e Cordas13 relatam que a o diagnóstico da pica pode ser dificultado pelo constrangimento dos pacientes em assumir o transtorno, considerado popularmente como uma perversão do paladar, mas, também por questões culturais. É difundido no imaginário social que a mulher grávida pode experimentar “vontades e desejos”, quase sempre por alimentos e (ou) preparações, mas também por substâncias consideradas não alimentares.37 No estudo de Baião,37 as puérperas revelaram que durante a gravidez sentiam um “desejo forte, aquela coisa louca de comer barro, pedra” e o interpretavam como algo impróprio, podendo ser motivo de críticas e julgamentos. Por isso, nem sempre compartilhavam esse transtorno para além das suas relações de parentesco, não assumindo esse comportamento, espontaneamente, e, mesmo quando questionadas, podiam omiti-la, por medo das reações que a revelação causaria. Para Saunders e col.,4 esse pode ser um fator de subestimação desse comportamento.
Vale ressaltar que na entrevista empregada para detecção do transtorno alimentar em questão,4 perguntou-se a gestante se a mesma tinha vontade de ingerir substâncias ou combinações de alimentos estranhas durante a gestação e a seguir se realmente ingeriam a substância. A partir dessas perguntas as próprias gestantes citaram as substâncias não alimentares e combinações incluindo frutas com sal e vinagre como estranhas.

Junges38 em seu estudo evidenciou preocupação com a detecção de apoio de pessoas da família e da rede social da gestante (mãe, sogra e vizinha) para a realização do desejo da gestante em ingerir substâncias não alimentares, orientações essas justificadas pela crença de que “para a gestante nada faz mal”. Uma constatação que chamou a atenção da autora foi que as gestantes entrevistadas não mencionaram os profissionais de saúde como apoio para sanar dúvidas com relação a esses estranhos desejos.

Dados do presente estudo sobre a frequência às consultas de pré-natal revelam que as gestantes praticantes de pica receberam menor número de consultas pré-natal do que as que não a praticavam; ou seja, não cumpriram o padrão mínimo de seis consultas estabelecido pelo Ministério da Saúde.25
Diante dos riscos associados aos transtornos alimentares, em especial a pica durante a gestação, para a mãe e para o concepto, este resultado remete à reflexão sobre o acesso, a cobertura e a qualidade do acompanhamento pré-natal oferecido na rede de atenção do Sistema Único de Saúde (SUS) e, recomenda-se que as gestantes com esse transtorno tenham um tratamento multidisciplinar e com intervenção preventiva, para prevenção de problemas futuros.7
Já é consenso na literatura que a freqüência mínima da gestante a seis consultas de pré-natal constituiu-se como fator de proteção contra intercorrências gestacionais e desfechos perinatais adversos.25,34,39,40
Face ao exposto, os profissionais de saúde devem monitorar cuidadosamente os comportamentos alimentares das gestantes. Além disso, no pré-natal os profissionais devem estar atentos aos desejos incomuns das gestantes para a ingestão de substâncias não alimentares e combinações atípicas, que podem influenciar o ganho de peso da gestante adolescentes e consequentemente, influenciar as condições ao nascer, como observado nesse estudo, além da associação com as deficiências nutricionais e intercorrências gestacionais, como observado em gestantes adultas brasileiras.4
Quanto ao cuidado nutricional, recomenda-se orientação individualizada, com o acompanhamento dos casos e negociação com a gestantes visando a prevenção da prática de pica e, escolha correta dos alimentos no contexto da alimentação saudável adequada para a promoção do ganho de peso recomendado na gestação e prevenção das deficiências nutricionais.


Anexo 1: TERMO DE CONSENTIMENTO LIVRE E ESCLARECIDO (TCLE)

Nome:_____________________________________________________________________ Entrevistador:__________________________Registro:_________________________ Prontuário:_________________ Data:_____/______/_______


Este documento lhe dará informações e pedirá o seu consentimento para participar da pesquisa “Programa de acompanhamento nutricional pré-natal para gestantes adolescentes”, que está sendo desenvolvida pelo Grupo de Pesquisa em Saúde Materna e Infantil/UFRJ e pela Maternidade Escola da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
O estudo pretende desenvolver um programa de acompanhamento de gestantes adolescentes pelo nutricionista na assistência pré-natal. O objetivo final do estudo é contribuir para a melhoria da qualidade da assistência pré-natal e para a redução dos principais problemas de saúde das gestantes e seus filhos.
Você está sendo selecionada pela sua presença na Maternidade Escola/UFRJ no dia de captação das gestantes para integrarem o estudo e a sua participação não é obrigatória. A qualquer momento você poderá desistir de participar e retirar o seu consentimento, sem que isso represente prejuízo para você na assistência pré-natal prestada na unidade.
Os procedimentos da pesquisa consistem no seu acompanhamento em consultas no ambulatório de nutrição, agendadas para o mesmo dia da sua consulta do pré-natal da unidade, com a realização de entrevista e consulta às informações de seu prontuário. No período de internação durante o pós-parto imediato, ou na consulta de revisão do pós-parto, caso você concorde, será realizada outra entrevista para saber a sua opinião sobre a sua gravidez, alimentação e o cuidado nutricional no pré-natal. Durante os primeiros seis meses após a gestação, faremos contato telefônico para saber sobre a sua saúde e do (a) seu(sua) filho(a). Está previsto, também, o agendamento de consultas no final do primeiro, terceiro e sexto mês após o parto ou, se for de sua preferência, faremos uma visita à sua residência para avaliar a sua saúde e o crescimento do(a) seu(sua) filho (a).

Esclarecemos que o risco decorrente de sua participação no estudo é o mesmo de procedimentos rotineiros da assistência pré-natal. Os benefícios relacionados com a sua participação são a avaliação e orientação nutricional ao longo da gestação, em consultas individuais e em grupo, que podem contribuir para a adequação do ganho de peso na gestação, prevenir e tratar os principais problemas de saúde que ocorrem na gestação e melhorar a saúde do(a) seu(sua) filho(a), sem nenhum custo.
Informamos ainda que não há remuneração ou recompensa de qualquer espécie decorrente da participação do estudo.
As informações que serão coletadas serão mantidas em sigilo, não sendo divulgadas em qualquer hipótese. Os resultados do estudo serão apresentados em conjunto, impossibilitando a identificação dos indivíduos que participaram do mesmo.

Declaro estar ciente das informações deste Termo de Consentimento e concordo em participar desta pesquisa.
Rio de Janeiro,______ de______________ de ______.


Participante ou representante legal: ____________________________________________

Coordenador da Pesquisa:________________________________________________________


Contatos do coordenador: Profa. Cláudia Saunders. Instituto de Nutrição Josué de Castro/UFRJ. Edifício dos Institutos, bloco J, 2º. andar. Centro de Ciências da Saúde, Ilha do Fundão. Rio de Janeiro. CEP. 21941-590
Tels. 2562.6601. e-mail: claudiasaunders@nutricao.ufrj.br


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